A jornada para descobrir o animal de poder é um momento profundamente significativo na prática espiritual de muitas bruxas brasileiras. Essa conexão com um espírito animal pode oferecer orientação, força e um senso de pertencimento ao mundo natural. No entanto, há uma questão cultural e simbólica que merece atenção crítica: a predominância de animais de poder oriundos de faunas estrangeiras, especialmente europeias ou norte-americanas, em detrimento da rica biodiversidade brasileira.
Esse fenômeno, que podemos chamar de “europeização dos animais de poder”, reflete um preconceito cultural inconsciente que privilegia símbolos e arquétipos de fora, muitas vezes em detrimento da fauna local. Lobos, corujas-das-neves, ursos e cervos são frequentemente mencionados como animais de poder por praticantes brasileiros, enquanto a onça-pintada, o tamanduá-bandeira, a arara-azul ou o boto cor-de-rosa são, por vezes, ignorados ou subestimados.
Essa tendência pode ser parcialmente explicada pela influência histórica da imigração europeia no Brasil, que trouxe consigo mitologias, folclores e tradições espirituais profundamente enraizadas no Velho Mundo. Além disso, muitos livros, filmes e materiais de ensino sobre espiritualidade e bruxaria são produzidos por autores estrangeiros, o que contribui para a idealização de arquétipos animais típicos do Hemisfério Norte. Vale salientar, que não há nada de errado em fazer uma jornada xamânica e descobrir que seu animal de poder é um leão, por exemplo. O que quero salientar nesse post, é: Até quanto nossa mente está condicionada a encontrar animais de uma fauna totalmente diferente da nossa?
Outro fator importante é o preconceito cultural que associa o “exótico” e o “superior” ao que vem de fora. A fauna brasileira, por mais rica e simbólica que seja, muitas vezes não é percebida como mística ou digna de ser incorporada em práticas espirituais, devido a uma desvalorização histórica da cultura indígena e das narrativas locais.
É crucial desconstruir a ideia de que certos animais são intrinsecamente mais poderosos, sábios ou espirituais do que outros. Essa noção reflete um preconceito cultural que não apenas limita as possibilidades espirituais dos praticantes brasileiros, mas também perpetua uma desconexão com a natureza local.
O Brasil é um dos países mais biodiversos do mundo, e sua fauna está repleta de arquétipos poderosos e únicos. A onça-pintada, por exemplo, é um símbolo de força e mistério, reverenciada por várias culturas indígenas como guardiã espiritual. O tamanduá-bandeira representa paciência e resiliência, enquanto a arara-azul simboliza comunicação e expressão vibrante.
Ao valorizar esses animais, os praticantes não apenas se conectam mais profundamente com o território em que vivem, mas também honram as tradições e sabedorias ancestrais das populações indígenas e afro-brasileiras, que sempre reconheceram a sacralidade da fauna local.
Caminhos para uma Conexão Autêntica
Para superar a europeização dos animais de poder, é importante que os praticantes:
- Pesquisem sobre a fauna local: Conheça os animais que habitam o Brasil e suas características simbólicas e espirituais.
- Estudem e defendam as tradições indígenas: Muitas dessas culturas possuem um conhecimento profundo sobre os animais e seus significados espirituais.
- Pratiquem a desconstrução de arquétipos importados: Questione por que certos animais parecem mais “místicos” ou “desejáveis”. Essa percepção é baseada em valores internos ou em influências externas?
- Meditem na natureza local: A conexão com o animal de poder pode ser facilitada ao passar tempo em ambientes naturais próximos, observando os animais e se permitindo ouvir o que a terra tem a dizer.
O animal de poder é uma ponte entre o humano e o natural, uma manifestação da conexão espiritual com o mundo ao nosso redor. No contexto brasileiro, honrar os animais locais é um ato de resistência cultural e de reconexão com a nossa identidade ancestral. Ao reconhecer a riqueza simbólica e espiritual da fauna brasileira, os praticantes podem criar uma espiritualidade mais autêntica, enraizada e conectada com o território que chamam de lar.